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Voyeur has been defined as someone who obtains sexual gratification from looking at sexual organs or sexual acts performed by others, and also as someone who enjoys observing other people’s private lives without their knowledge.
Voyeur has had a negative meaning as it has been understood as implying an intentionally wrong act.

According to Marcel Proust voyeurism can be performed by the lover looking through the window at his beloved. Nowadays, this image looks too idealistic. It belongs to another world somewhere in the past.

Voyeur understood as an act of seeing/looking/observing in the general sense has become a hobby in present day Western world - one can observe not only one’s own daily life as well as, through the media, see images of others miserable lives.

To observe is safer than to adventure in the inherent dangers of present day world. As such, to exist entails to be a voyeur, by the impossibility/difficulty of being anything else, and, therefore, to live through a visual culture saturated by publicity, wars, politics, pornography, … where frontiers merge and have become obsolete.  We see constantly images/scenes that ironically reflect our own factuality and freedom. We are not aware of our own positioning because we ourselves are nothing.

According to Sartre, “…since I am what I am not and I am not what I am - I cannot define myself as truly being in the act...” of voyeurism. “Not only I cannot know myself, as also my own self eludes me – even though I am myself this eluding is my own being - and I am absolutely nothing."

But then who detains the power? The one that looks or the one that has what the other desires? the object of desire?

 

 

A definição generalista de voyeur é de uma pessoa que obtêm prazer olhando secretamente outras pessoas tendo relações sexuais, e também uma pessoa que gosta de olhar para os problemas e vida privada de outras, sem elas saberem. Esta palavra: voyeur, teve no passado, um significado negativo, sugerindo um acto de má-fé.

O conceito de voyeur pode ser encontrado no amante descrito por Proust, olhando discretamente através de uma janela para o seu amor. Esta imagem parece ser demasiadamente idealista aos nossos olhos, nos dias de hoje. Pertence de certeza a um outro mundo, algures no passado.

Nos nossos tempos ser voyeur tornou-se um passatempo no mundo ocidental, a que podemos assistir diariamente, não só no nosso próprio dia a dia, como através da média que bombardeiam o público com imagens das vidas miseráveis de outros.

 Olhar, hoje, é mais seguro do que uma pessoa aventurar-se pelos perigos inerentes do mundo. Existir, hoje, significa ser voyeur por impossibilidade de ser outra coisa, e viver numa cultura visual saturada de imagens de publicidade, guerra, politica, pornografia, onde as fronteiras se esbateram, estão obsoletas. Existem, constantemente, cenas que são vistas, e que de um modo irónico reflectem a nossa liberdade. Não somos consciência posicional de nós mesmos, porque somos, nós próprios, nada.

 Segundo Sartre: “Nesse sentido – posto que sou o que não sou e não sou o que sou -, não posso sequer definir-me como estando verdadeiramente no acto (...)” de voyeur. “Não somente não posso conhecer-me, como também meu próprio ser me escapa – embora eu seja este próprio escapar a meu ser – e não sou absolutamente nada.”

Mas afinal quem é que detêm o poder? A pessoa que olha, ou a pessoa que têm o que o outro deseja?

 

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Em entrevista a Pierre Cabanne, Duchamp diz: “Eu desejava mudar a minha identidade e, primeiramente, pensei adoptar um nome judeu. Eu era católico, e esta passagem de uma religião para outra já significava mudança. Mas não encontrei nenhum nome judeu de que gostasse ou que despertasse a minha fantasia e, de repente, tive uma ideia: Porque não mudar de sexo? Era mais fácil!” Deste modo surge Rsose Sélavy, fruto não só de uma mudança de identidade e de género sexual, mas também de um jogo de palavras. Os dois “R” remetem para uma assinatura de Duchamp num quadro de Picabia intitulado: Eil Cacodylatc, no qual escreveu: “Pi qu`habilla Rrose Sélavy”, foneticamente pode ser lido como: “Picabia l´arrose c´est la vie”, ou “Eros c´est la vie”

Rrose Sélavy, o duplo de Duchamp, ou o seu feminino nasce em Nova Iorque em 1920, quando Duchamp transfigurado em mulher deixa-se fotografar por ManRay. Rrose é um travesti enigmático com sexualidade andrógena, como também é uma artista e obra. Para além de apropriar-se de readymades, Viúva Imprudente (1920), continua a escrever trocadilhos de palavras: “Rrose Sélavy acha que um incesticida deve dormir com a mãe dele, antes de a matar; os percevejos são indispensáveis”

A célebre e última obra de Marcel Duchamp, Etant Donnés é exemplo disso mesmo, exposta permanentemente a partir de 1969 no Museu de Arte de Filadélfia, após a morte do seu autor, transporia Rrose Sélavy para uma obra de sexualidade aberta. Obra satírica, um peep-show, na qual o observador é desafiado a abandonar o seu ponto de vista de receptor passivo e tornar-se consciente da sua posição de voyeur. Duchamp viola o corpo feminino, ao utilizá-lo de uma maneira metafórica. De algum modo a mulher abandonada de Etant Donnés é Rrose Sélavy, a Viúva Imprudente. Isto é, Duchamp ele próprio um voyeur, que capta imagens indecifráveis, ou ele próprio um enigma.

 

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“Peeping Tom” (1960) de Michael Powell é um filme macabro e aterrador sobre um voyeurismo sádico. O realizador Michael Powell e a sua personagem Mark Lewis (Karlheinz Böhm) têm um ponto em comum: ambos são obcecados pela imagem. O primeiro plano da película é um grande plano de um olho que atormenta o espectador, é a aparição de Mark que esconde a sua cara atrás da câmara, para posteriormente retirar o seu olho da vista, baixar a câmara e finalmente deixar surgir a sua cara. Este plano sintetiza o filme. Estamos perante uma testemunha do olho, do seu próprio voyeurismo, um ciclope.

Mark Lewis era aparentemente um miúdo normal, mas fora sujeito a experiências bizarras pela mão do seu próprio pai. Cientista, homem da ciência que estudava o sistema nervoso humano e que por isso necessitava de uma cobaia, durante a infância do seu filho este foi submetido aos seus vários testes de personalidade projectados para observar as suas reacções e comportamentos, e, em todos os momentos, o medo de seu filho. Mark é agora um adulto traumático e silencioso, e tem como passatempo a continuação dos estudos do seu pai, agora através da sua câmara de filmar, assassinando mulheres para poder captar as últimas imagens angustiantes do horror da morte.

O pé da câmara têm uma lâmina que é usada para matar enquanto filma a morte, mas também é um substituto fálico, pois usar este pé da câmara é única penetração possível para Mark. Mark prepara os projectores e dirige a “actriz” nos gestos, intervém na posição da vítima como um verdadeiro realizador. Não interessa a violação como o assassinato, interessa sim é a imagem, o ritual da última cena com a “actriz”, a representação perfeita da imagem. 

            Acabando por estabelecer um relacionamento com Helen Stephens (Anna Massey), inquilina que é conservada e estimada por ele, esta acaba por descobrir a horrível verdade, e, não se tornando uma das suas vítimas, acaba por surgir como redentora.

A vida de Mark é uma projecção longa e inacabada a que põe um termo. Existido somente através das películas, no silêncio, pode expressar as suas emoções utilizando a luz dos projectores que utiliza para filmar, ou a projecção luminosa das suas películas e seus fantasmas. Agora, encontrará a serenidade na escuridão. A luz do filme é sinónimo de terror, pois a luz encadeia a vítima antes de definhar, e a escuridão é por isto mais tranquila e protectora. É na escuridão absoluta que se encontra a salvação, e Mark encontrá-la-á na morte. A imagem -  a luz - é para ele sinónimo do sofrimento causado pelas experiências e atrocidades do seu pai. Mark mata-se da mesma maneira que matou as suas vítimas, um assassinato de que não vê o resultado, pois é um suicídio, surpreendendo a sua testemunha, Helen Stephens com a própria frustração ao lamentar o facto de não poder ver o seu suicídio. 

 

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 “Janela Indiscreta” (1954) é um estudo sobre o voyeurismo e a obsessiva curiosidade humana, baseado numa história de Cornell Woolrich e realizado pelo mestre do suspense, Alfred Hitchcock.

A história gera uma situação intensa de suspense que vai crescendo ao longo do filme, L.B. Jefferies (James Stewart), representa muito mais que um simples personagem. Ele é um fotógrafo, acostumado a ter um olhar cirúrgico. Confinado ao seu apartamento devido a um acidente que o deixou imobilizado numa cadeira de rodas, tem a partir da janela do seu apartamento um amplo campo de visão da vida quotidiana dos apartamentos vizinhos. A impossibilidade de interferir (espectador) e a profunda relação com a história (tanto para o fotógrafo, quanto para o espectador real) fazem deste filme uma analogia do relacionamento entre o público e o filme.

Durante a sua inocente vigilância voyeuristica ocorre algo estranho num apartamento de um vizinho e por mais que ele relate o acontecimento à sua namorada Lisa Carol Fremont

(Grace Kelly) esta não acredita em algo tão implausível. Será que L.B. Jefferies presenciou realmente um assassinato, ou foi só imaginação?

“Blow-Up”(1966) do director Michelangelo Antonioni expõem-nos e examina a natureza da realidade também através da fotografia, bem como a natureza da percepção humana. Partindo do “Princípio da Incerteza” ou “da Indeterminação” (1927) de Werner Heisenberg que afirmou que é impossível especificar e determinar, simultaneamente e com precisão absoluta a posição e a velocidade de uma partícula, pois o próprio acto de medida perturba, até certo ponto, o fenómeno. Assim partindo deste pressuposto, Antonioni reivindica que o acontecimento observado, está alterado pela mera presença do observador. A observação, não é nunca um processo neutro ou abstracto. O princípio adjacente da narrativa de “Blow Up” será o de nenhum fenómeno ser puro, pois quando as emoções humanas entram no jogo, deixam em consideração a culpa, o obsessão e, finalmente, o medo.

Londres, anos 60, um fotógrafo very stylish, Thomas (David Hemmings), vive uma carreira de excesso e glamour. Thomas vê algo (ou talvez não) ao fotografar, num parque de Londres por mera casualidade. Thomas torna-se então obcecado pela possibilidade de ter fotografado um assassinato. (É aquele um corpo sob os arbustos?) Enquanto a sua obsessão cresce, Thomas repetidamente amplia, estuda, e monta os seus negativos para encontrar a prova final, a evidência da ocorrência possível.

Uma outra imagem indelével, que enfatiza a linha entre a realidade objectiva e a ilusão, encontra-se no final do filme, no qual Thomas participa com um grupo de jovens mascarados numa pantomima, lança-lhes uma bola de ténis invisível e jogam um jogo impossível de descrever. As bolas, as raquetes de ténis e a audiência não existem. Na mente de Thomas ouve-se a ilusão, o som de um jogo real do ténis, através do soundtrack do filme.

Qual a natureza da realidade? Nós deformamos o natural com interpretações e inflexões. Será que houve um assassinato? será que houve um morto? Ou a imaginação voyeuristica de uma mente num quotidiano delirante?